O
oferecimento de denúncia na Justiça contra quem agride no ambiente
familiar não dependerá mais da vontade da vítima, segundo definiu ontem o
Supremo Tribunal Federal (STF). Por 10 votos a 01, os ministros
decidiram que o Ministério Público pode entrar com a ação penal, em
casos de violência doméstica, mesmo que a mulher decida voltar atrás na
acusação contra seu companheiro. Segundo a Procuradoria-Geral da
República (PGR), a violência doméstica cometida pelo companheiro ocorre
em pelo menos 90% dos casos.
Ontem,
o STF julgou uma ação de inconstitucionalidade de autoria do Ministério
Público. A instituição pedia que, nos trechos em que a Lei Maria da
Penha condiciona a denúncia por agressões leves à vontade da vítima, o
STF desse a interpretação para que o Ministério Público passasse a ter a
prerrogativa de atuar. A ideia é que o Estado proteja a vítima quando
ela se mostra incapaz de fazê-lo.
A
maioria acompanhou o voto do relator, ministro Marco Aurélio Mello.
"Aos 65 anos, eu não acredito mais em Papai Noel. Sem proteção, as
mulheres desistem de processar seus agressores", disse o ministro. O
ministro Luiz Fux afirmou que a ideia da alteração é intimidar os
agressores, já que, agora, eles saberão que a ação judicial continuará
independentemente da vontade da mulher.
Uma
das mais enfáticas no julgamento, a ministra Cármen Lúcia afirmou que
ela própria é vítima de preconceito. "Às vezes acham que juíza desse
tribunal não sofre preconceito. Mentira. Sofre! Há os que acham que aqui
não é lugar de mulher", disse a ministra. Ela contou que quando está no
carro oficial do tribunal nota olhares preconceituosos: "Na cabeça
daquele que passa, estamos usurpando a posição de um homem. Imagina-se a
esposa de alguém que deve estar trabalhando enquanto ela está fazendo
compras."
O
único voto contrário foi o do presidente da Casa, ministro Cezar
Peluso. No seu entendimento, a alteração pode ser um retrocesso à
proteção da mulher, já que ela pode desistir de denunciar seu
companheiro à polícia na medida em que a lei não permite que ela abra
mão de uma ação contra ele na Justiça. Para Peluso, hoje, muitas
mulheres levam os casos de agressão ao conhecimento da polícia porque
sabem que poderão voltar atrás mais adiante.
Peluso
defendeu que o legislador foi consciente ao determinar que a vítima
deve dar seu aval para a abertura de ação. "O ser humano se caracteriza
por ser sujeito da sua história, pela capacidade que ele tem de decidir
por um caminho, e isso parece que transpareceu quando a lei foi
elaborada".
Fonte: Blog Seridó 190 (Link ao lado)
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